sexta-feira, 25 de abril de 2025

a minha historia parte 1

 A Vida nas Mãos dos Fantoches" — A história de Vítor Costa, o Fantocheiro da Vila da Parede

Eu sou Vítor Costa, filho de João Santa Bárbara. Nasci e cresci na vila da Parede, onde a vida era simples, dura, mas cheia de alma. Naquele tempo, a infância era feita de correrias pelas ruas, de brincadeiras improvisadas, e de idas à escola… poucas, é verdade, porque a vida não deixava muito espaço para os cadernos.
O meu pai, homem de mãos calejadas e coração inteiro, trabalhava como varredor na Câmara Municipal de Cascais. A minha mãe cuidava de nós com o que podia e o que não podia, mas muitas vezes era o meu irmão que fazia de pai e de mãe, assumindo responsabilidades grandes demais para os ombros de uma criança.
Não havia muito para comer — nem pão, nem conforto — mas havia família. Havia dignidade. Havia aquele espírito de sobrevivência que só quem já passou fome entende. Aos fins de semana, o meu pai transformava-se. De varredor passava a artista. Levava-nos com ele, eu e os meus irmãos, com os seus "Robertos" — os fantoches tradicionais portugueses — para as feiras, para as praias, para as festas populares. Era ali que ele dava vida às vozes escondidas nas mãos, fazia rir os pequenos e encantar os grandes.
À noite, a barra dos "Robertos" virava abrigo. A gurita — aquele pequeno palco de madeira — era também o nosso quarto, o nosso teto debaixo das estrelas. Dormíamos ali, eu e os meus irmãos, embalados pelos ecos das palmas do dia.
Foi num desses dias mágicos, em 1983 ou 84, na feira de Setúbal, que a minha vida mudou. O meu pai tinha ido à taberna, como fazia às vezes, e a barriga já pedia comida. Olhei para o meu irmão, o Tó Zé, e disse:
— “Vamos fazer um espetáculo. Temos que comer.”
Montámos os bonecos, improvisámos falas, e puxámos pelo que tínhamos aprendido com o nosso pai, com a vida. Nesse dia, nasceu o fantocheiro que sou até hoje. Nunca mais parei.
A vida ensinou-me que com duas mãos e uma história, é possível arrancar sorrisos até nos tempos mais difíceis. Os "Robertos" deram-me um caminho. E eu segui-o, com orgulho, com luta, e com amor por essa arte antiga que atravessa gerações.